No início do século XX, fruto de experiências anteriores, nasceu na Europa a Economia Social, que se apoiou nas novas formas organizativas da sociedade, como as mutualidades, as associações e as cooperativas, para realizar atividades económicas sem fins lucrativos, mas com finalidades sociais. O seu já longo percurso fê-la passar por várias fases e agora parece estar a ressurgir, numa época de crise económica e social. Corre, no entanto, o perigo de ser apenas um mero substituto do Estado em esferas em que este prefere delegar em vez de atuar diretamente, de acordo com a visão de um “Estado mínimo”.
Quando falamos de Economia Solidária, o conceito é diferente. O objetivo é criar atividades económicas sustentáveis, geridas na base da cooperação entre os seus trabalhadores/as, numa perspetiva de desenvolvimento local e de construção de outras relações sociais, emancipadoras e equitativas. Tem por isso uma visão mais multidimensional, que vai para além do económico, e integra fortemente a educação, a cultura, a ação política para a transformação social.
A expressão nasceu no Brasil, no final dos anos 1980, servindo para cobrir uma enorme quantidade de experiências concretas, muito variadas, que ocorriam em vários países da América Latina, muitas vezes reatualizando práticas de solidariedade ancestrais ou simplesmente mais antigas, agora numa lógica de fazer face ao presente e de contribuir para o futuro.
Um dos traços distintivos da Economia Solidária é justamente o facto de partir da realidade para ir elaborando e enriquecendo a sua própria natureza, ao invés de confrontar a sociedade com um certo número de regras e indicadores, para classificar que atividades estão dentro ou fora desta ideia. O que significa que é verdadeiramente uma proposta em construção, na qual desempenham um papel vários atores, que interagem colaborativamente: participantes dos empreendimentos concretos, académicos (muitas vezes também praticantes), responsáveis políticos, sobretudo ao nível local. No Brasil existe, desde 2003, a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), criada no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego. Como acontece com qualquer conceito vivo, os debates são permanentes.
No entanto, a maioria das pessoas que se têm dedicado a compreender e sistematizar o conhecimento das realidades nesta perspetiva coloca o acento nalguns pontos fundamentais: na valorização do trabalho, através da concretização de relações de trabalho cooperativas, democráticas e criativas, baseadas na autogestão no seio dos empreendimentos; na promoção da autonomia, individual e de grupo, no contexto da comunidade a que se pertence, baseada no pensamento crítico e na co-responsabilidade; na visão para além do grupo, ou seja, no desenvolvimento das comunidades a vários níveis, a começar pelo local; na iniciativa produtiva como resposta às necessidades das pessoas e das comunidades e não como meio de gerar lucro, independentemente do que se produz, para quem e de que forma.
Avançando nesta via, o economista brasileiro Euclides Mance propôs a formação de redes de colaboração solidárias que, ligando a produção à transformação, à distribuição e ao consumo, criariam cadeias produtivas baseadas na solidariedade e na satisfação das necessidades reais de todos e não só de alguns. É uma forma de outros tipos de economia se irem fortalecendo, ganhando experiência e espaço no interior da sociedade e economia desiguais, hoje dominantes no planeta.