Comércio Justo

O Comércio Justo (CJ) é um movimento internacional, criado nos anos 1960 na Holanda (com experiências antecessoras nos Estados Unidos na segunda metade dos anos 1940), baseado na promoção de uma aliança entre todos os atores da cadeia comercial, dos produtores/as aos consumidores/es, excluindo os intermediários não necessários, visando denunciar as injustiças do comércio e construir princípios e práticas comerciais cada vez mais justos e coerentes.

 

A ideia foi inspirada pela posição de representantes dos países do Sul que em 1964, na Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (CNUCED), defenderam, sem sucesso, uma nova conceção do apoio ao desenvolvimento: “trade, not aid” (“comércio, ajuda não”). E foi evoluindo, tendo em conta o contexto do mundo em que vivemos (ver os artigos O império do consumo", de Eduardo Galeano e As contradições do mundo actual", de Ana Rávia Borges Badue e outros).

 

O Comércio Justo assumiu desde o início duas missões indissociáveis: a sensibilização dos cidadãos e cidadãs sobre as regras e o funcionamento do comércio, quer internacional, quer nacional e local, e a atividade comercial baseada em regras justas e transparentes. Nenhuma delas faz sentido sem a outra, como se pode constatar ao ler o artigo "As duas almas do Comércio Justo", de Angelo Caserta.

 

Nascido da indignação perante as injustiças do comércio internacional, e da procura de alternativas neste âmbito, o movimento foi elaborando, ao longo das primeiras décadas, uma série de princípios básicos, como

  • o respeito e a preocupação pelas pessoas e pelo ambiente, colocando as pessoas acima do lucro;

  • o estabelecimento de boas condições de trabalho e o pagamento de um preço justo aos produtores e produtoras (cobrindo as exigências da proteção ambiental e da segurança económica, para além do rendimento digno);

  • a proteção e a promoção dos direitos humanos, nomeadamente os das mulheres, das crianças e dos povos indígenas, bem como a igualdade de oportunidades entre os sexos;

  • a disponibiização de pré-financiamento ou de acesso a outras formas de crédito;

  • o estabelecimento de relações comerciais estáveis e de longo prazo;

  • a produção tão completa quanto possível dos produtos comercializados no país de origem;

  • o reforço das capacidades organizativas, produtivas e comerciais das produtoras e dos produtores através da formação e aconselhamento técnico e comercial;

  • a transparência da estrutura das organizações e de todos os aspectos da sua atividade, e a informação mútua entre todos os intervenientes na cadeia comercial sobre os seus produtos ou serviços e métodos de comercialização.

Mas, atenção: as relações sociais e comerciais são demasiado complexas para que se possam resumir a um conjunto de normas que, aliás, são exigentes, não faz sentido serem impostas, mas progressiva e colaborativamente assumidas, não só por alguns, mas por todos os intervenientes da cadeia e são permanentemente desafiadas por novas realidades.

 

Na viragem para o século XXI, mercê do seu crescimento, começaram a surgir práticas contraditórias no seio do movimento, dando origem a uma diferenciação de posicionamentos e opções. Os debates principais em curso dizem respeito às seguintes questões:

 

- o CJ deve assentar só nas exportações do Sul para o Norte? Qual o lugar do comércio local e regional, seja no Sul, como no Norte? (ver artigos aqui)

- introduzir produtos de CJ nas grandes cadeias de distribuição e nas multinacionais é coerente com os princípios do CJ? Permite tornar o sistema de comércio internacional vigente mais justo? (ver artigos aqui)

- atribuir um selo a um produto dá-nos a garantia de que o produto foi produzido, transformado e distribuído de forma justa? (ver artigos aqui)


O CIDAC participa desde 2008 na rede ibérica Espaço por um Comércio Justo, cujo Manifesto, assumindo que “o comércio internacional não é o motor do desenvolvimento”, defende “um Comércio Justo transformador”, baseado na Soberania Alimentar, numa “relação de cooperação e não impositiva”, na “transformação dos produtos em beneficio do meio rural” e num “trabalho indissoluvelmente ligado à sensibilização e à denúncia”.